segunda-feira, 14 de março de 2011

Quase a ida a Farim

No sábado passado eu e um grupo de amigos decidimos ir até Farim. Quer dizer, reconhecer o caminho até Farim pois tinham-me dito que o sítio onde era para deixar as viaturas não era o melhor. Saímos de Bissau, todos contentes e fomos andando sempre nas calmas. O primeiro destino era Mansoa, que tinha alguma curiosidade em ver e conhecer.
Chegámos a Mansoa e fomos ao mercado. No mercado era rico em produtos agrícolas mas pobre em peixe, mas como não podia deixar de ser, tinha bagre defumado. Esse marca sempre a sua presença, mais que não seja devido ao seu estado de conservação. Em Mansoa depois do mercado vi uma cabra esfolada pendurada à porta de um estabelecimento. Perguntei aos meus colegas se não queriam comer cabra. Fomos negociar o preço do pedaço que queriamos comprar. Acertámos o preço em 2000 CFA, e o senhor começou a preparar a carne de cabra. Cortou-a aos pedaços e reacendeu o fogareiro.
Aproveitei e fui dar uma vista de olhos pela cidade. É uma cidade engraçadita, quente, mas simpática. Dei uma volta turistica e rápida onde estavam presentes velhos monumentos da época colonial, inclusivé uma central eléctrica de 1952. Quando regressei a carne estava assada. Tudo para dentro de um saco plástico, para mais tarde fazer um piquenique e voltamos ao caminho. Desta vez em direcção a Farim.
Pelo que sei existem dois caminhos para chegar a Farim. Um vai desde Bissau a São Domingos e depois para Farim, o outro é de Bissau, Mansoa e depois atravessa-se o rio de piroga para chegar a Farim. O caminho por São Domingos foi-me desaconselhado por causa da proximidade com a fronteira com o Senegal e os rebeldes de Casamança. Parece que os rebeldes de vez em quando entram em território guineense e fazem das suas, além disso o caminho por Mansoa é bem mais perto.
Quando nos fizemos ao caminho novamente tudo na maior, afinal acho que eram só 30 ou 40 quilómetros até ao destino. O pior foi a condição da estrada, tinha um pouco de alcatrão no meio dos buracos, resultado perto de hora e meia para fazer o percurso.
Pelo caminho vimos paisagens novas e diferentes e inclusíve animais novos. Vimos uma família de macacos a atravessar a estrada e uma deles, depreendo que fosse uma macaca, levava um filhote na barriga, pois vi duas caudas a abanarem. Uma cauda era grande e a outra mais pequenita. Um bocado mais à frente vimos uma prática que parece comum naquelas zonas, vimos várias queimadas a serem feitas sem ninguém a vigiar.


Aqui está uma queimada sem eira nem beira.
Continuámos nós rumo a Farim. Buraco sim, buraco sim com uma margem de manobra para outro buraco e o caminho foi continuando devagar, devagarinho. Passado quase duas horas lá chegámos nós ao nosso destino. O lado sul da margem do rio Cacheu e com Farim à vista.

Farim à vista.

No meio disto tudo quase a alcançar Farim. Mas devido às horas a que chegámos ao nosso destino, por volta das 15 horas, não atravessámos para o outro lado. Pois depois teríamos de efectuar o caminho de volta durante a noite e andar por estes lados de noite não é muito aconselhável.
No retorno a Bissau e debaixo de 40 graus celsius, parámos para comer. Lá foi um piquenique à maneira. Carne de cabra de Mansoa, atum, pão de Safim e de Mansoa, água de Portugal e um belo queijo curado dos Montes Hermínios. Foi um festim, mas sempre com os olhos numa queimada que se aproximava, mais e mais.
Foi assim que fomos e voltámos e sem ir a Farim, mais um bocado da Guiné que ficou comigo, mas também mais um bocado de mim que ficou imcompleta por não ter ido a Farim, e uma promessa de voltar e desta vez ir a Farim.

terça-feira, 8 de março de 2011

Recordações de Portugal

Hoje fui comer com uns amigos a um restaurante em Bissau. Entrámos, escolhemos os pratos que queriamos e conversámos. No meio dessa conversa surgiu algo que me transportou para memórias esquecidas de Portugal. Não sei se nas vossas terras natais se passava o mesmo, mas na minha aldeia era sempre uma festa.
Essas memórias levaram-me a divagar por partes de infância há muito esquecidas e agora relembradas. Agora que estou a recordar do momento no restaurante, vejo que o acontecimento que despoletou tudo foi graças à nova tecnologia. Foi um simples toque de telemóvel que me transportou. Levou-me para um sítio em que não existiam preocupações com nada, a não ser claro com os nossos pais. Parece a cena do filme "Ratatui" onde um apreciador gastronómico assim que coloca a primeira garfada de comida na boca é transportado para a infância.
Voltando ao relato, que eu já falei de muito, menos das minhas recordações. Estávamos no restaurante, quando toca um telemóvel. Até aqui nada de novo, o que fez despoletar foi o toque em questão. Quantos de vocês se lembram de ouvir o instrumento que o amola tesouras toca? Foi exactamente esse som que ouvi. Lembrei-me logo dos senhores nas suas bicicletas e com a pedra de amolar no suporte traseiro. Mas estes homens amolavam tesouras e facas e ainda arranjavam guarda-chuvas ou chapéu de chuva. Depois comentei que na minha terra já não se vê ninguém com esse tipo de trabalho, ao que uns amigos me disseram que estão a voltar. Depois dessa recordação também me lembrei de uns homens que passavam pela aldeia a tocar vários instrumentos. Eles tinham um bombo, um prato em cima do bombo e pelo menos mais uma harmónica. Era sempre uma alegria, pois conseguiam tocar tudo ao mesmo tempo. Não tenho a certeza dos nomes dos intrumentos, a minha área não é bem a música é mais uma coisa de números. Mas voltando atrás, sempre que se ouvia ao longe era imediatamente uma correria para a rua, só para ouvir um bocadinho daquele som. Na minha zona chamava-se "O Homem dos Sete Instrumentos", e pela conversa que tivemos também tinha o mesmo nome em zonas diferentes do país.
Já repararam que estas pequenas coisas marcaram-nos na nossa infância e que pura e simplesmente desapareceram? Ou então pouco se vê por Portugal fora? São coisas que os nossos filhos nunca vão poder presenciar e ver, mas também admito que existiram muitas coisas que os nossos pais viram e que eu não vi. Isto tudo pode-se resumir ao seguinte - "É o Preço do Progresso". Progresso esse que traz sempre coisas boas e coisas más. Neste caso até foi o progresso que proporcionou o que vos estou a contar.